No Brasil a educação não tem inimigos. Todos sabem o seu valor e entendem que a degradação da educação significa a degradação do futuro. Já cansei de ler que a educação do povo é um dos mais valiosos recursos de uma nação.
Com tudo isto em mente e aproveitando que tenho um filho estudando nos EUA, resolvi avaliar alguns pontos deste tema com a nossa educação. Em 1882 Rui Barbosa já alertava o nosso atraso educacional fazendo comparações com EUA. Acho que ninguém prestou atenção na sua fala e hoje as diferenças são abissais.
Se você tem interesse em educação, este texto é uma provocação!
Se você é professor, também acho que não vai gostar deste texto.
Se eu pudesse resumir o sistema educacional americano, eu diria que ele tem 3 pilares: Liberdade, Meritocracia e Competição.
Vamos lá, ponto por ponto.
Talentos
Os EUA são um ímã na atração de talentos em todo o mundo. Meu filho ganhou medalhas em olimpíadas brasileiras e nem mesmo com as de ouro recebeu qualquer contato de uma universidade brasileira. Das americanas, vários convites.
Ingresso
Ao contrario do nosso ideológico vestibular, a avaliação do aluno é completa. As universidades americanas querem conhecer o individuo no geral. Há entrevistas, cartas de recomendação, analise das notas no ensino médio e querem saber o que o aluno fez fora da escola (teve alguma contribuição para a comunidade local?). É uma avaliação global.
Responsabilidade
Na sua matricula, o aluno não recebe uma grade curricular “pronta”, mas ele terá que montar a sua própria grade. Ele é informado quais matérias terá que cursar, mas fica a seu critério a montagem de quantas matérias ele terá no quadrimestre. Neste ponto o aluno começa a entender quais são os seus deveres.
Avaliação
As maioria das notas são dadas de tal forma que o valor depende da sua posição em relação a média da turma. Não importa ter acertado 90% da prova. Se a maioria da classe acertou mais que você, seu conceito (de “A” a “F”) será ruim. E sempre ficará claro quem é o melhor e quem é o pior da turma.
Já no Brasil, os colégios e professores evitam comparações entre alunos para não tirar a confiança dos que não tem um desempenho tão bom.
Rigor Acadêmico
Não importa se você estiver pagando mais de 60 mil dólares em anuidade. Se você não atingir o mínimo estabelecido pela escola, você receberá uma notificação curta e grossa: ou você melhora ou terá que deixar a faculdade no próximo quadrimestre. A única exceção é se você comprovar que estava preso ou internado em algum hospital.
Infra estrutura
Como não poderia ser diferente, as salas de aula são excepcionais:
Horário dos professores
Na maioria das escolas há painéis informando onde se encontra cada professor no seu horário de trabalho.
Não acreditei e fui conferir.
Resultado: bati em uma sala com uma porta aberta onde um Premio Nobel se levantou e perguntou em que poderia me ajudar…
Vale Educação
Neste ponto, estamos na idade da pedra. A Lava Jato sempre afirma na sua cruzada contra a corrupção que o segredo é “seguir o dinheiro”.
Não sei por que não fazemos isto na educação. Aqui o financiamento público “segue o aluno”, que é livre para escolher a escola — pública ou privada — que irá frequentar.
Ou seja, os recursos públicos não são das escolas; são dos alunos. Os diretores sabem que a sua escola não tem mercado cativo como no Brasil. Ou apresenta bons resultados acadêmicos, ou perderá alunos para a concorrência (pública ou privada). E perderá o financiamento.
Tecnologia
No caso de meu filho, sua universidade utiliza esta arma poderosíssima:
Cada aluno tem um desses nas salas de aula, pois em toda aula o professor interrompe a matéria que está sendo dada e formula uma pergunta sobre o que acaba de ser ensinado.
Após a pergunta, o aluno tem 30 segundos para escolher uma das alternativas da pergunta que é projetada na sala. Isto se dá através deste controle, promovendo uma avaliação mais acurado do estudante.
Resumindo, a participação na aula, através de comentários, perguntas e respostas, é algo obrigatório. Isso força os alunos a se prepararem para as aulas e aprender a demonstrar seu ponto de vista de forma estruturada.
E o Brasil? Geralmente o professor fala durante toda a aula e o aluno passivamente escuta.
Além do mais, este controle possibilita algumas coisas:
Plano de aula
Aqui o professor não dá a aula que ele quer, mas aquela que segue o plano estabelecida pela direção da escola. Assim, o aluno sabe em cada aula qual matéria será dada e já se prepara para a avaliação da mesma.
Desenhando, aqui o professor ensina e o aluno aprende.
Responsabilidade
Com este controle a escola sabe qual matéria o professor ministrou e quais alunos faltaram de maneira “on-line”.
Resultado, em quase dois anos meu filho não teve até agora nenhuma aula adiada/cancelada ou algum professor que tenha chegado atrasado.
Avaliação do Professor
Todos, sem exceção, são avaliados a cada quadrimestre. Se nestas provas feitas durante as aulas a escola perceber que a média da classe foi baixa demais, ela começa uma investigação para saber se a matéria daquele professor está sendo ensinada de forma didática e de compreensão adequada pelos alunos.
Carreira
Você tem até 2 anos depois do ingresso na faculdade para se direcionar, o que permite ao aluno mudar de curso. Sim, a escolha da carreira (aqui chamada de “Major”) é feita após cerca de dois anos de disciplinas gerais (chamada de “Minor”).
Reforçando, você não é aprovado para um curso ou departamento, mas você é aprovado para a instituição.
Isto possibilita que você, aos 17 anos, uma idade que não dá muita segurança do que fazer na vida, possa trocar de curso. Você pensava que queria ser engenheiro, mas depois da conhecer melhor as matérias, resolve fazer Administração.
Se fosse no Brasil, este tempo da sua vida seria praticamente perdido e você teria que voltar no tempo e prestar outro vestibular.
Dever de casa
O segredo da educação, para muitos especialistas, é uma questão de utilização do tempo. Neste ponto, não há um santo dia em que o meu filho não volte para casa com uma tarefa para ser feita.
Greves
Outra diferença fundamental é que nos EUA uma lei federal proíbe aos servidores públicos qualquer tipo de paralisação ou movimentos grevistas.
Comunidade
Nos EUA há uma lei proibindo criação de uma escola pública ou privada sem a participação dos pais nos estatutos e direção do estabelecimento.
Liberdade
Aqui não tem uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) ditada por um governo central, mas cada escola tem a liberdade de estabelecer o seu currículo de acordo com a comunidade local e a quatro mãos com os pais.
É impressionante o poder que as Associações de Pais tem por aqui.
Estabilidade
De maneira geral, os professores públicos não tem estabilidade (academic tenure) e podem ser demitidos como qualquer servidor privado. Quando conseguem algum tipo de estabilidade, ela é dada pelo departamento e pela direção da faculdade e não por uma lei goela abaixo. E pode ser retirada pela falta de produtividade.
Pesquisa
Ao contrário do Brasil onde a maioria das universidades fecha as portas para o setor privado, aqui um pesquisador faz, em média, pesquisas com empresas privadas 3 meses/ano.
Recursos
Você deve estar pensando, com tudo isto, só um país rico.
Pois saiba que nos EUA apenas 31% dos recursos do ensino superior são públicos. O restante, como consequência desta forte parceria, vem do setor privado. Não há um edifício na Universidade da Califórnia que não tenha o nome de seu doador.
Enfim, percebo de forma clara que aqui não encontro a maioria dos vícios da educação brasileira atual, como o desprezo de conteúdos, o repúdio a métodos de avaliação da qualidade do ensino ou dos professores, dentre tantos outros. Se no Brasil a preocupação é cumprir um currículo, aqui é valorizado o aprendizado que leve o aluno a refletir como o seu estudo poderá influenciar na sua vida.
Você pode até não gostar de alguns pontos acima, mas saiba que em qualquer ranking mundial, geralmente entre as 10 melhores universidades do mundo, 7 ou 8 são americanas.
Como diria Joaquim Nabuco, “É a nossos filhos que pagamos a nossa divida para com os nossos pais”.
Uma boa educação é o melhor começo para saldarmos esta divida.